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Críquete feminino reformula ideia de sucesso

Por Richard Taylor

Num momento em que a atenção da mídia esportiva está voltada para a Copa do Mundo de Futebol Feminino, vale lembrar que o planeta futebol abriga também outros esportes com bola que despertam paixões. O cricket, por exemplo, é um dos esportes mais populares e emocionantes do mundo. Mais de um bilhão de pessoas na Índia seguem os jogos regularmente. Temos que admitir que ainda não são tantos no Brasil – ainda é um esporte de nicho em termos geográficos – mas isso pode estar prestes a mudar!

Na Inglaterra e Austrália, a série de jogos de cricket “The Ashes” é uma das mais disputadas. Este ano, tanto os jogos femininos quanto os masculinos proporcionaram drama e entretenimento extraordinários, e alguns resultados inesperados. Claro, existem esportes semelhantes em muitos países, onde objetos redondos são atingidos com bastões, raquetes ou tacos – mas o cricket é com certeza o mais bizarro, complicado e longo.

Se já for um aficionado por cricket, pode pular essa parte. O cricket existe na Inglaterra desde 1550 e faz parte da cultura inglesa há séculos. É semelhante ao bete-ombro ou tacobol no Brasil. A versão do cricket é jogada no Brasil desde meados de 1800 e existem clubes prósperos em todo o país, incentivados pelo Conselho Internacional de Cricket. O ICC tem mais de cem nações membros, mas apenas 12 países jogam na elite do esporte, em partidas chamadas “Test”. Trata-se de um teste de cinco dias de força, resistência e habilidade para ambas as equipes e seus torcedores. Cerca de 6 horas de críquete são jogadas em cada um dos 5 dias com intervalos para almoço, chá e bebidas. Compreender a estranha terminologia e as sutilezas das regras e da ética é um prazer duradouro que pode levar a vida inteira. O objetivo é vencer, marcando mais pontos (“runs”) do que o adversário. Mas este objetivo principal pode estar prestes a mudar…

Este mês, contra todas as probabilidades, a Inglaterra conseguiu se recuperar de duas derrotas, e empatar a última série do Ashes contra a Austrália. Embora os primos dos Estados Unidos tenham dificuldade de entender como um jogo ou uma série de jogos, possa terminar em empate e com alguém satisfeito com isso, a capitã da Inglaterra, Heather Knight, disse que a série foi “a melhor que já existiu na história do jogo feminino”.

A primeira série de Tests femininos entre a Inglaterra e a Austrália foi disputada pela primeira vez há 89 anos, em 1934. Desde 2013, as Ashes femininas têm um formato diferente do jogo masculino com partidas “One Day Internationals” e “Twenty20”, bem como um jogo de cinco dias, todos contando para o resultado. A Austrália é atualmente a melhor equipe em todos os rankings mundiais de críquete feminino.

De volta à história… o nome “The Ashes” foi adotado há 140 anos, depois que a Austrália venceu a Inglaterra pela primeira vez em solo inglês em 1882. Após esse jogo, um jornal britânico publicou um obituário lamentando que o cricket inglês tivesse morrido no estádio Oval em Londres e que “o corpo tivesse sido cremado e as cinzas [“ashes”] levadas para a Austrália”. Um dos primeiros exemplos de fake news, mas a ironia aumentou o valor do prêmio de ganhar e, desde então, a cada dois anos, uma série de grandes jogos é realizada em busca de vencer, reconquistar ou reter os Ashes.

The Ashes é realmente uma batalha e é difícil exagerar a importância da vitória para os ingleses e australianos, homens e mulheres. Trata-se de uma luta de proporções épicas para os atletas disputam o topo do esporte. A mecânica de jogo é difícil. Com uma bola dura sendo movida, rebatida e apanhada a mais de 100 km/h, é preciso muita habilidade e prática para afastar o perigo. Mas isso vem acontecendo há séculos, então o que há de novo?

O que o críquete feminino traz de novo

Uma revolução está acontecendo no cricket inglês – um novo estilo. A seleção feminina agora joga de uma forma destemida e atacante que a mídia chama de “Jonball” em homenagem ao técnico da equipe, Jon Lewis. “Jon nos permitiu reformular como é o sucesso”, disse Nat Sciver-Brunt, estrela da Inglaterra, na semana passada. “O sucesso nem sempre são as vitórias – é todo o resto. É mais sobre como queremos jogar, inspirar e entreter pessoas.” Com finalizações dramáticas, o Ashes atraiu um público recorde, três vezes maior do que em 2019.

Nat Sciver-Brunt disputando mais uma “The Ashes” pela Inglaterra.

Foto: Graham Hunt/ProSports/Shutterstock

O lado espectador do cricket tem uma cultura. Cada jogo aumenta o tesouro de estatísticas e anedotas que mantêm todos ocupados e divertidos em dias quentes e chuvosos. Com sua nova abordagem, o cricket feminino agora está aumentando o cânone de histórias e números. Algumas pessoas dizem que o novo estilo é divertido e não importa se você ganha ou perde. Para atletas profissionais, isso está longe de ser verdade. Eles realmente acreditam que ao perderem o medo de perder, aumentam as chances de vencer.

O estilo encoraja os batedores e arremessadores (“bowlers”) da Inglaterra a se expressarem em todas as oportunidades da forma que for possível. McCullum disse “…vamos jogar sem cuidado, sem consequências, porque vamos jogar todos os dias como se fosse o nosso último e para o inferno o julgamento.”

Tradicionalmente imbuídas de estratégias mais complexas, englobando menos agressividade em favor do controle, cautela e resistência, as partidas de Test agora estão mais emocionantes e exaustivas tanto para jogadores quanto para aficionados.

O novo estilo tem apoiadores e críticos que, nas derrotas, dizem “não pode ser sério – this is just not cricket”. Mas todo mundo adora quando a equipe está ganhando (ou até empatando).

Os fãs de críquete estão aumentando, os times se divertindo e criando ótimas lembranças para todos. Mas, vale lembrar: para ter força de espírito para jogar ou mesmo acompanhar o críquete, é preciso passar pelo primeiro teste. Assistir a equipe perder e continuar amando essa maluca estratégia. Esse, sim, é um verdadeiro teste!

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