Existem muitas versões sobre a criação do golfe. Há relatos de que os escoceses já o praticavam desde 1400. Mas, assim como o futebol, o início do golfe não foi fácil. O esporte sofreu muitas represálias e chegou a ser banido sob a acusação de atrapalhar a prática do arco e flecha, que não era apenas uma modalidade esportiva, mas uma prática de defesa dos escoceses nos campos de batalha. No entanto, aos poucos o esporte, que chegou a fazer parte do Programa Olímpico em Paris 1900, Saint Louis 1904, Rio 2016 e Tóquio 2020, foi conquistando cada vez mais adeptos. O Campo Olímpico de Golfe, fundado na Barra da Tijuca, Zona Oeste da Cidade, um dos legados dos Jogos de 2016, segue fomentando o esporte e dando acesso a novos competidores através de aulas gratuitas. Tido como um esporte elitizado, o golfe anda dando tacadas em áreas de vulnerabilidade do Rio de Janeiro.
O Projeto Fábrica de Campeões GOLFE CDD, criado na Cidade de Deus, foi um dos primeiros a dar acesso a crianças de baixa renda. Fundado e coordenado por Marcelo Modesto, mais conhecido como Marcelo do Quilombo, oferece diversas atividades gratuitas para os moradores locais, entre elas, as aulas de golfe.
Filho de mãe solo, Marcelo conheceu cedo as dificuldades de morar na Cidade de Deus. Graças a uma mistura de sorte e esforço conseguiu uma vaga para trabalhar como caddie (carregador de materiais dos atletas) num campo de golfe próximo à comunidade, onde teve a possibilidade de aprender e se desenvolver no esporte. Chegou a carregar a bolsa com tacos de Luiz Carlos Pinto, conhecido como Pelé do Golfe, primeiro preto a liderar o ranking nacional do esporte e lá permanecer por 8 anos. Essa vivência foi um estímulo para Marcelo seguir treinando e concluir a formação para dar aulas. Hoje, faz parte do time de professores do Campo Olímpico de golfe do Rio.
Mas o sonho de Marcelo ia além. Queria dar a outros garotos da comunidade a oportunidade de vencer através do golfe. Firmou uma parceria com os responsáveis pelo campo de golfe do Rio e os alunos do projeto social, que treinavam em um espaço improvisado na comunidade, passaram a ter aulas gratuitas com materiais de golfe no campo da Barra da Tijuca uma a duas vezes na semana. Nos outros dias da semana ou quando a ida ao campo se torna inviável por diversos motivos, inclusive dificuldades de locomoção dos alunos, Marcelo dá as aulas no jardim do espaço social.
"Como eu trabalho com golfe desde os meus 13 anos, são 44 anos nesta caminhada. Iniciei o projeto Tacada Certa, que depois virou o Fábrica de Campeões. Através da modalidade praticada você vê essas crianças conhecerem outras realidades, ambientes e costumes, como ter noção de inglês, etiqueta, educação. Pois é normal a relação acontecer com o alto escalão da sociedade. Usamos o golfe para incentivar as crianças a estudar, a auto valorização, e mostrar para eles que são inteligentes, bonitos e podem se tornar elegantes, posicionados e, com isso, fazer a possibilidade de um sonho distante se tornar realidade através da educação e do esporte, que trabalha posicionamento intelectual, organização, paciência, determinação, foco e auto valor. Nosso objetivo é transformá-los em campeões da vida", explica Marcelo.
Foto: acervo pessoal Marcelo do Quilombo
O material usado pelos alunos durante as aulas foi doado pelos sócios do Campo Olímpico. Tudo novo ou em ótimo estado de conservação, o que é um incentivo a mais para os jovens atletas, que já sonham em disputar uma olimpíada. Das mais de 150 crianças que tiveram aulas de golfe através do projeto, cerca de 40 passaram pela peneira e se tornaram alunos regulares. Além da habilidade para o esporte, eles mostraram que têm postura, concentração, foco e muita vontade de acertar o green e dar uma tacada de sorte na vida.
Commenti