Nadadora paralímpica da classe S2 dá palestras motivacionais e se destaca pelo senso de propósito e fé inabaláveis
Por Mariana Canedo
Nascida na comunidade de Rio das Pedras, zona oeste do Rio de Janeiro, Jessyca Oliveira, de 19 anos, teve os braços e as pernas amputados quando tinha apenas 10 anos de idade em decorrência de uma infecção generalizada (doença meningocócica). Mas o que poderia ter sido um grande drama para aquela criança, se transformou em uma poderosa lição de vida.
“Sempre fui muito ativa e independente. Minha mãe saía para trabalhar e eu não queria que ela chegasse em casa sem que estivesse tudo arrumado. Eu também gostava muito de brincar com as crianças na rua. Aproveitei bastante meus membros”, disse a jovem.
Sua mãe, Silvania, conta que aos 6 anos de idade Jessyca foi diagnosticada com psoríase, doença inflamatória crônica e não contagiosa de pele, que se caracteriza pelo aparecimento de placas. Era o início de uma história de provação.
“Na escola as mães pediam para os filhos não ficarem perto da Jessyca e eu precisei levar um atestado médico para provar que não era contagioso. Ela só queria ir de calça comprida, mesmo no verão”, conta Silvania, que na época era vendedora de loja de roupas, enquanto o pai de Jessyca, Leandro, trabalhava como porteiro de um prédio no Leblon.
Junto ao tratamento de Jessyca para a psoríase, a família começou a fazer terapia em grupo, por indicação dos médicos que cuidavam do seu caso. “Eu me sentia sozinha e não falava. E parecia que o meu corpo falava por mim”, contou.
Em maio de 2015, aos 9 anos, Jéssyca se preparava para viajar para Angra dos Reis com a avó. Animada para sair do Rio e conhecer um lugar diferente, a menina procurou não dar muita atenção às dores de cabeça que começaram na sexta-feira daquele final de semana. Após a viagem de ônibus no sábado, Jessyca também ignorou o enjoo que sentiu na viagem e conseguiu até brincar com os primos naquela tarde. À noite começou a ter febre e no domingo apresentou dificuldade para se levantar.
Manchas começaram a surgir pelo seu corpo rapidamente e ela entrou no banho. Começou a vomitar e desmaiou. A família a levou às pressas para uma Unidade de Pronto Atendimento e a primeira suspeita foi de dengue. Ficou em observação e após ser transferida para um hospital com mais recursos, uma das médicas suspeitou da meningococcemia, confirmada após exames específicos.
Jessyca passou 20 dias em coma enquanto, ainda em Angra dos Reis, os médicos tentavam eliminar com medicamentos a bactéria causadora da meningococcemia. Quando foi transferida para o hospital Pedro Ernesto, no Rio de Janeiro, a mãe ficou incumbida de dar a notícia de que seria necessário amputar seus braços e pernas para eliminar a bactéria.
“Depois da primeira amputação, quando eu olhei, chorei. Não conseguia falar, pois estava entubada. Olhei para o lado e vi meu pai e ele falou com amor que estava tudo certo, que ia ficar tudo bem. Naquele momento entendi que ali havia um propósito e passei pelas outras amputações sem aquele sofrimento do começo”, disse Jéssyca.
Após 6 meses internada, uma infecção hospitalar provocou uma perda auditiva e mais uma vez, Jessyca reagiu positivamente: “O Senhor mandou aquela situação não somente para transformar a minha vida, mas da família. Entrei em aceitação e resiliência”. No total, ela passou 1 ano e 2 meses internada para realizar todas as cirurgias. “Fiz a primeira comunhão e tive minha festa de 11 anos no hospital e recebi muito carinho dos profissionais que cuidaram de mim, assim como dos meus pais”, relatou.
O paralimpismo e a nova perspectiva de vida
Em 2016, pouco antes de completar 12 anos, o espírito paralímpico deu a Jéssyca uma nova perspectiva: “Estive no Parque Aquático Maria Lenk para assistir as competições de natação e vi pessoas em condições parecidas com a minha competindo e ali eu vi que era possível”.
Meses após os Jogos de 2016, começou a praticar a natação paralímpica e, em 2019, foi para o Vasco da Gama. Já como paratleta do clube, participou de sua primeira competição regional em 2021 e, em 2022 e 2023, conquistou duas medalhas, uma de prata e uma de bronze, em competições nacionais. Como precisou se submeter a cirurgias para acompanhar o crescimento ósseo, não pôde disputar as seletivas para Paris-2024, mas irá torcer pela companheira de treino Lídia Cruz, que se classificou para os Jogos pelos resultados conquistados no Parapanamericano do ano passado em Santiago do Chile.
Além da determinação de participar da próxima edição dos Jogos Paralímpicos, Jessyca também tem outras metas. Muito ativa, participa do grupo de jovens da igreja que frequenta, treina no Clube de Regatas Vasco da Gama e faz aulas de inglês. Em 2025, pretende começar a cursar a faculdade de psicologia. Além disso, dá palestras motivacionais e participa de campanhas de conscientização sobre a vacina contra meningite. Também tem sido procurada por grandes marcas para ajudar na promoção de ações de inclusão e reconhecimento do potencial de pessoas com deficiência.
“Quero poder inspirar e motivar outras pessoas, mostrar que é possível ser feliz. Quero mudar meu pensamento e ajudar outras pessoas a terem saúde mental”, finalizou a atleta, dando mais uma vez um grande exemplo de amor à vida.
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