top of page
bruxellasproducoes

Uma rainha negra no topo

Por Cláudio Nogueira


Rebeca Andrade está reinando. Dona do maior tesouro olímpico do Brasil, com o recorde de seis medalhas – dois ouros, três pratas e um bronze, conquistados nos Jogos de Tóquio-2020 e de Paris-2024 – a jovem de 25 anos já merece um capítulo à parte na história esportiva do país. E mesmo que o adjetivo histórico costume ser aplicado a atletas e outros personagens incontestáveis por não mais se encontrarem neste mundo – como Pelé, Ayrton Senna ou Adhemar Ferreira da Silva – as séries e saltos executados pela super ginasta já a qualificam apropriadamente desta forma e fazem dela, atualmente, a maior personalidade do esporte brasileiro, entre mulheres e homens.  


Foto: Ricardo Bufolin


Sem deslumbramentos, desde o megaevento de Tóquio, no qual obteve um ouro e uma prata, e mesmo agora, depois de Paris – onde conquistou um ouro, duas pratas e um bronze - Rebeca continua muito consciente do que necessita para se manter no topo: disciplina e treino. Ao longo da semana, ela e os outros medalhistas olímpicos de seu clube, o Flamengo, foram homenageados na sede da Gávea: as ginastas Jade Barbosa, Flávia Saraiva e Lorrane Oliveira (bronze por equipes, junto com Rebeca), a judoca Rafaela Silva (bronze por equipes) e o canoísta Isaquias Queiroz (prata na canoagem de velocidade) ganharam, cada qual, um quadro em que foram reproduzidos seus grandes momentos nas Olimpíadas. Oitocentas pessoas prestigiaram o evento. 

Por meio das redes sociais, Rebeca fez um balanço musical de seus bem sucedidos dias em Paris, cantando "Amarelo, azul e branco", sucesso da dupla  Anavitória. 

"É sobre ter força para não desistir, ter garra e lutar até o final. É sobre incentivar, apoiar e fazer os outros acreditarem que é possível! Dizer e comprovar que a sua gratidão e sua fé te fizeram chegar tão longe, que até pra você que viveu tudo fica difícil de explicar! É sobre representar todo mundo e se sentir representado também! É sobre se orgulhar, chorar, vibrar, gritar, passar raiva, mas sentir uma alegria que invade o peito de todos quando você vence a si mesmo!", afirmou a ginasta e estudante de psicologia.  

Para a atleta, as medalhas representam muito, pois cada pódio é um motivo de orgulho, qualquer que seja a cor da medalha, pelo privilégio de poder representar bem o país. Segundo a atleta, a experiência olímpica é na realidade o resultado conquistado por alguém que deu o melhor de si.  

    "É subir no pódio pra receber a sua medalha e se orgulhar independentemente da cor, porque só você sabe o que precisou enfrentar para chegar ali. É subir no pódio da vida depois de ter dado o seu máximo e viver uma Olimpíada! Tudo é resultado e é sempre um passo para crescer cada vez mais, mesmo que você não tenha alcançado o seu objetivo final. É ter gana pra querer mais, fazer mais, buscar mais, porque enquanto a chama do objetivo estiver acesa, o fogo interno continuará queimando e a chance de chegar no seu lugar mais alto, vai continuar rolando! Obrigada Paris-2024", escreveu ela em seu Instagram. 

Acostumada a superar adversidades desde a infância, em que ela e seus sete irmãos foram criados por uma mãe-solo, Dona Rosa, doméstica, Rebeca começou na ginástica em sua terra natal, Guarulhos, na Grande São Paulo, antes de se transferir para o Flamengo, no Rio. Nos Jogos de Paris, foi responsável pela conquista de uma das três medalhas de ouro do Brasil (foram três ouros, sete pratas e dez bronzes, somando 20 ao todo). Os outros ouros foram da judoca Beatriz Souza e da dupla de vôlei de praia Duda e Ana Patrícia. Dentre as medalhistas de ouro, Rebeca, Beatriz e Ana Patrícia são negras. 

    "Acho que os pretos sempre mostraram a sua capacidade, mas essa Olimpíada está sendo uma Olimpíada em que isso está tendo muito mais visibilidade. A gente conseguiu mostrar, sim, que a gente pode alcançar, que a gente pode chegar. Ser uma mulher preta no Brasil é algo que me orgulha muito”, enfatizou, ainda em Paris, a ginasta, que tem entre seus admiradores a própria Simone Biles, considerada a maior ginasta de toda a história, a ex-primeira dama dos EUA Michelle Obama e a atriz Viola Davis. 

Conforme ela própria relata, Rebeca aprendeu com sua mãe a não baixar a cabeça diante de atos preconceituosos em relação à cor de sua pele. 

  “Nunca vi a minha cor como algo que fosse me impedir de realizar as minhas coisas. Isso foi algo que me foi ensinado dentro de casa. Minha mãe é uma mulher branca que criou oito filhos pretos. Então ela sempre se posicionou da melhor maneira possível e ensinou a gente a nunca abaixar a nossa cabeça quando alguém fala alguma coisa ou faz alguma coisa com a gente por causa da nossa cor. Então sempre fui muito forte”, narrou, antes de prosseguir: “A gente não pode aceitar (o racismo), as pessoas também vão ter que ver que a gente vai estar no topo, sim. É preto no topo e pronto”. 

    Rebeca se encontra atualmente na trilha de grandes atletas femininas brasileiras do passado, como: a nadadora Maria Lenk, primeira atleta sul-americana  nas Olimpíadas, em Los Angeles-1932; a tenista Maria Esther Bueno, vencedora de 19 torneios de Grand Slam, em simples e duplas;, entre os anos 1950 e 1970; Jacqueline e Sandra Pires, do vôlei de praia, primeiras mulheres medalhistas de ouro olímpicas, em dupla, em Atlanta-1996; Daiane dos Santos, primeira campeã mundial de ginástica, no solo em 2003; Maurren Maggi, do atletismo, a primeira medalhista olímpica de ouro do Brasil no individual, em Pequim-2008, entre outras campeãs e medalhistas em esportes individuais e coletivos. Se todas brilharam e fizeram história, mas já encerraram suas caminhadas desportivas, os fãs brasileiros do esporte têm o privilégio de seguir ao vivo a carreira da maior medalhista olímpica do país. Outras rainhas e princesas já elevaram a bandeira do Brasil mundo afora. Mas agora é a vez de Rebeca Andrade. E ela segue reinando.

51 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page